domingo, 23 de agosto de 2009

bibliotecas conjecturadas (6): "L'espace littéraire"


"Escrever é ser atraído para fora do vivido, do mundo, em direção à Eurídice, aos infernos – espaço da escritura. Orfeu se volta para Eurídice, pois não voltar-se seria trair uma experiência simultaneamente essencial e arruinadora da obra, experiência onde se atinge o ponto extremo, o extremo risco, exigência paradoxalmente impossível da obra. A experiência é experiência da escritura, busca impossível da origem e da morte. É experiência da atração da origem: o desobrar; e impossibilidade de “olhar” a origem: o obrar."

(Maurice Blanchot)

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Ler Maurice Blanchot é escrever-se no não-findo da conversação. O texto blanchotiano exige o direito de morte e de ausência na distância. Desse modo, toda experiência literária é órfica por ser no nível da impossibilidade, daquilo que se marca pela falta na origem. O silêncio silencia - se pudermos parodiar Heidegger quando diz que a "coisa coisa" - e nessa ação há apenas o intransitivo da sensação da escrita. Calar-se é a forma de por a escrita em circulação, aliás, é a circulação que define a escritura como movimento do pôr em obra a obra - o "obrar", necessariamente físico e constitutivo. Assim, toda obra nasce da ruína. Uma ruína previamente estabelecida e esperada. Os passos lentos e leves de Eurídice demonstram a violação e inscrevem a escrita como violação essencial do homem. Nesse sentido, Blanchot nos impõe violar-nos - no sentido mais sexual possível - na enunciação da escrita de si, toda escrita como esse si.

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